Nesta quarta-feira (28) a série documental Território em Fluxo, produção do Brasil de Fato sobre a Cracolândia em São Paulo (SP), é lançada no Youtube. São cinco episódios que, se contrapondo a abordagens estigmatizantes, retratam a complexidade e as disputas em torno deste território a partir das pessoas que ali atuam. Os protagonistas são os usuários e os coletivos que trabalham com redução de danos e defesa dos direitos humanos.
O documentário chega em momento de “aprofundamento da política higienista” na região por parte da prefeitura de Ricardo Nunes (MDB) e do governo Tarcísio de Freitas (Republicanos), na avaliação de Giordano Magri, pesquisador do Centro de Estudos da Metrópole (CEM).
“A gente tem visto, sobretudo nos últimos meses, um ataque muito direto a esses coletivos, porque é muito difícil remover de uma área pessoas que não têm casa. Você tira elas dali, à noite podem voltar. Então, como remove quem se move? Estrangulando e matando as alternativas de sobrevivência que elas têm. E isso se dá muito através [do impedimento de atuação] dos coletivos”. A fala de Magri foi na pré-estreia do Território em Fluxo. E antecipou que aconteceria pouco tempo depois.
No último 11 de maio, o local onde o fluxo da Cracolândia se concentrava, entre um muro e gradis na rua dos Protestantes, no Centro da cidade, amanheceu vazio. Usuários e ativistas afirmam que a violência da Guarda Civil Metropolitana (GCM), que agora cerca a área para que não seja novamente ocupada, se intensificou. Uma semana antes, coletivos foram impedidos de entrar no fluxo.
Assista aqui o Território em Fluxo.
A proibição teve como base um ofício da gestão municipal de Nunes de dezembro de 2023, aplicado apenas agora. A diretriz determina que atividades “fora da rotina” que possam juntar muita gente, causando “sons e ruídos”, só podem acontecer se autorizadas pela Subprefeitura da Sé. Esta, por sua vez, é chefiada pelo coronel da reserva da Polícia Militar (PM), Marcelo Salles.
É o trabalho desses coletivos, cuja “política higienista” prefere que sejam tirados do caminho, um dos pontos centrais do Território em Fluxo. Geração de renda, redução de danos, palhaçaria, cuidado em liberdade, arte, letramento, moradia, atividades com baixa exigência de constância são a base das iniciativas de boa parte destes grupos que implementam no território alternativas práticas à lógica da guerra às drogas.
“Os coletivos trazem algo de diferente. Quarta à noite, cinema, doação de pipoca, doação de bolo, água, preservativo, e por aí vai. Pô, é diferente”, conta Renato Oliveira Junior, frequentador da Cracolândia, no documentário. “O TTT [projeto Teto, Trampo e Tratamento] a duas horas no fluxo, pessoal para para ver, para participar, sabe? Tem o Blocolândia também, que é o bloco de carnaval da Craco”, elenca Renatinho, como é conhecido.
Além destes, a série conversa e retrata a atuação do Pagode na Lata, Tem Sentimento, Centro de Convivência É de Lei, Paulestinos, Cia Mungunzá, A Craco Resiste, Ocupação Mauá, bar Soberano e bar da Nice, entre outros.