A ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, criticou duramente a aprovação no Senado do Projeto de Lei (PL) 2159/2021, apelidado de “PL da Devastação”, que afrouxa o licenciamento ambiental no país. Em entrevista ao Conexão BdF, da Rádio Brasil de Fato, a ministra classificou a proposta como “uma afronta total do Congresso Nacional” e ressaltou a contradição de sua tramitação avançar às vésperas do Dia Mundial do Meio Ambiente, celebrado nesta quinta-feira (5).
“Consideramos uma afronta total do Congresso Nacional, exatamente uma semana anterior à Semana do Meio Ambiente. Teria que ser um mês em que pudéssemos adotar medidas de proteção e cuidados com o meio ambiente. E o que vemos é um desmonte total da legislação que já existe”, criticou Guajajara.
Para a ministra, a proposta vai na contramão dos esforços climáticos globais, especialmente diante da proximidade da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP 30), que será realizada em novembro, em Belém do Pará. “O PL da Devastação é realmente muito ruim. Ele libera os territórios, toda essa destruição do meio ambiente. Estamos prestes a receber a COP 30 no Brasil. Precisamos ter medidas robustas para enfrentar a mudança climática de forma concreta”, defendeu.
Além das críticas ao PL, Guajajara também repudiou os ataques misóginos a Marina Silva, ministra do Meio Ambiente, durante uma audiência no Senado sobre o tema. “Foi uma brutalidade, um machismo terrível. Acho que o mundo inteiro viu isso. […] Abomino toda a atitude dos parlamentares, a forma como se tratou a ministra Marina Silva”, afirmou.
Avanço no fortalecimento de órgãos ambientais
Apesar dos retrocessos no Legislativo, a ministra celebrou os avanços recentes no fortalecimento de órgãos ambientais, como o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) e a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai). Na terça-feira (3), o governo Lula (PT) anunciou um apoio recorde do Fundo Amazônia ao Ibama, com recursos voltados à criação de novas unidades de conservação e ao reforço da fiscalização ambiental.
“O Ibama é o principal órgão que faz essa fiscalização, esse monitoramento juntamente com a Funai. Recebemos tanto a Funai como o Ibama em 2023 totalmente sucateados, com servidores insuficientes e orçamento muito ”, lembrou, referindo-se ao desmonte promovido durante o governo anterior, do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Ela também destacou a realização de concursos públicos, que devem recompor parte do quadro funcional. “Conseguimos ter o concurso público para a Funai, 503 servidores estão sendo chamados já agora para ser nomeados”, anunciou Guajajara. Segundo ela, os novos investimentos permitirão que os órgãos cumpram suas missões institucionais de proteger o meio ambiente e garantir segurança em territórios indígenas.
Justiça lenta no caso Bruno e Dom
A ministra também comentou os três anos do assassinato do indigenista Bruno Pereira e do jornalista britânico Dom Phillips, ocorrido em 2022, no Vale do Javari, no Amazonas. Para ela, o crime foi “um choque muito grande” e expôs os riscos enfrentados por defensores dos direitos humanos e do meio ambiente.
“Infelizmente, ainda temos que lidar com essa lentidão, essa morosidade da Justiça. Mas aqui, enquanto Ministério dos Povos Indígenas, seguimos fazendo articulações com órgãos responsáveis, como o Ministério da Justiça, a Polícia Federal”, afirmou.
Entre as medidas adotadas, Guajajara destacou a elaboração de um plano de desintrusão para garantir a segurança de servidores da Funai e povos indígenas na região. O esforço também resultou na aprovação do porte de armas para servidores da fundação, em contextos específicos, como forma de possibilidade de autodefesa em áreas de conflito.
Pautas indígenas na COP 30
Com a COP 30 se aproximando, Guajajara afirmou que o governo brasileiro está empenhado em garantir uma participação ativa dos povos indígenas na conferência da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre o clima. O Ministério dos Povos Indígenas está articulando um plano de participação em quatro frentes: sociedade civil, espaço oficial da conferência (zona azul), formação de negociadores de comunidades originárias e o chamado “círculo dos povos”, liderado pela própria ministra.
Segundo ela, o objetivo é garantir que as políticas nacionais recebam apoio financeiro internacional, além de inserir temas centrais como demarcação de terras, adaptação, mitigação, gênero e perdas e danos nas negociações globais. “A pauta da demarcação das terras indígenas é uma política global que vai mitigar as mudanças climáticas”, defendeu.
“Nós estamos confiantes e trabalhando para que essa COP dê certo. Afinal de contas, não adianta só ficar reclamando e dizendo que vai ser um caos. Temos a responsabilidade de fazer com que esta COP tenha importantes decisões, uma ampla participação dos líderes governamentais dos países desenvolvidos, que assumam compromissos robustos de financiamento para garantir que as políticas nacionais possam ser apoiadas”, concluiu.
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